Kurt Gödel e o Teorema da Incompletude: A descoberta Matemática Nº 1 do Século XX e suas relações com fé e razão
Este artigo de Perry Marshall (traduzido ao português por Mateus Scherer Cardoso) me causou um deslumbramento tão grande que decidi publicá-lo aqui por inteiro. Eu o encontrei durante um intervalo da leitura do artigo Science and the Restoration of Culture, de Wolfgang Smith, que cita Gödel e que me deixou com vontade de me aprofundar mais no tema. Não perdi meu tempo. (Claro, primeiro tive de quebrar a cabeça aqui e aqui. E, por fim, também sugeri Gödel para a galeria Cearenses Internacionais.)
O Teorema da Incompletude de Gödel:
A Descoberta
Matemática Nº 1 do Século XX
Em 1931, o jovem matemático Kurt
Gödel fez uma descoberta-marco tão poderosa quanto qualquer coisa que
Albert Einstein desenvolveu, desferindo um golpe devastador nos matemáticos de
sua época.
A descoberta de Gödel não se aplica somente à
matemática, mas literalmente a todos os ramos da ciência, lógica e conhecimento
humano. Ela tem verdadeiramente implicações que abalam a Terra.
Estranhamente, poucas pessoas sabem qualquer coisa
sobre ela.
Permita-me contar-lhe a história.
Os matemáticos adoram provas. Eles estavam furiosos
e chateados por séculos, porque eles eram incapazes de PROVAR algumas das
coisas que eles sabiam que eram verdade.
Por exemplo: se você estudou geometria no colégio,
você fez os exercícios nos quais você, baseado em uma lista de teoremas, prova
todos os tipos de coisas sobre os triângulos.
Aquele livro de geometria do colégio é feito sobre
os cinco postulados de Euclides. Todos sabem que os postulados são verdadeiros,
mas em 2500 anos ninguém imaginou um meio de prová-los.
Sim, parece sim perfeitamente razoável que uma
linha possa ser estendida infinitamente em ambas as direções, mas ninguém tem
sido capaz de PROVAR isso. Nós só podemos demonstrar que eles são um conjunto
de 5 suposições razoáveis e de fato necessárias.
Grandes gênios matemáticos estavam frustrados por
mais de 2000 anos porque eles não podiam provar todos os seus teoremas. Havia
muitas coisas que eram “obviamente” verdade, mas ninguém conseguia imaginar um
meio de prová-las.
No início dos anos 1900, entretanto, um tremendo
senso de otimismo começou a crescer nos círculos matemáticos. Os matemáticos
mais brilhantes do mundo (como Bertrand Russell, David Hilbert e Ludwig
Wittgenstein) estavam convencidos que estavam rapidamente se aproximando de uma
síntese final.
Uma “Teoria de Tudo” unificada, que finalmente
amarraria todos os pontos soltos. A matemática seria completa, à prova de
balas, hermética, triunfante.
Em 1931, este jovem matemático austríaco, Kurt
Gödel, publicou um artigo que de uma vez por todas PROVOU que uma única Teoria de Tudo é realmente impossível.
A descoberta de Gödel foi chamada de “O Teorema da
Incompletude”.
Se você me der alguns minutos, eu lhe explicarei o
que ele diz, como Gödel o descobriu e o que ele significa – em português
simples e direto que qualquer um pode entender.
O Teorema da
Incompletude de Gödel diz:
“Qualquer coisa em
que você pode desenhar um círculo ao redor não pode ser explicada por si mesma
sem se referir a algo fora do círculo – algo que você tem que assumir mas não
pode provar.”
Expresso em Linguagem
Formal:
O teorema de Gödel diz: “Qualquer teoria
efetivamente gerada capaz de expressar aritmética elementar não pode ser
simultaneamente consistente e completa. Em particular, para qualquer teoria formal consistente e efetivamente
gerada, que prova certas verdades aritméticas básicas, existe uma afirmação
aritmética que é verdadeira, mas que não pode ser provada em teoria.”
A Tese de Church-Turing diz que um
sistema físico pode expressar aritmética elementar assim como um humano pode, e
que a aritmética de uma Máquina de Turing (um computador) não pode
ser provada dentro do sistema e é igualmente sujeita à incompletude.
Qualquer sistema físico sujeito a medição é capaz
de expressar aritmética elementar. (Em outras palavras, crianças podem fazer
matemática contando em seus dedos, a água fluindo para um balde
faz integração, e sistemas físicos sempre dão a resposta certa.)
Portanto, o Universo é capaz de expressar
aritmética elementar e, tanto como a própria matemática e uma máquina de
Turing, é incompleto.
Silogismo:
1. Todos os sistemas computacionais não-triviais
são incompletos.
2. O Universo é um sistema computacional
não-trivial.
3. Portanto, o Universo é incompleto.
Você pode desenhar um círculo ao redor de todos os
conceitos no seu livro de geometria do colégio. Mas eles são todos feitos sobre
os cinco postulados de Euclides, que claramente são verdadeiros mas que
não podem ser provados. Esses cinco postulados estão fora do livro, fora do
círculo.
Você pode desenhar um círculo ao redor de uma
bicicleta, mas a existência dessa bicicleta depende de uma fábrica que está
fora do círculo. A bicicleta não pode explicar a si mesma.
Gödel provou que há
SEMPRE mais coisas que são verdadeiras do que você pode provar. Qualquer sistema de lógica ou números
que os matemáticos possam desenvolver sempre se baseará em pelo menos umas
poucas suposições que não podem ser provadas.
O Teorema da Incompletude de Gödel não se aplica
somente à matemática, mas a tudo que está sujeito às leis da
lógica. A incompletude é uma verdade na matemática, e é igualmente verdadeira na
ciência, na linguagem ou na filosofia.
E, se o Universo é matemático e lógico, a
Incompletude também se aplica ao Universo.
Gödel criou sua prova começando com o “Paradoxo do
Mentiroso” — que é a afirmação:
“Eu estou mentindo.”
“Eu estou mentindo” é autocontraditória, já que, se
é verdade, eu não sou um mentiroso, e, se é falsa, eu sou um mentiroso, então é
verdade.
Então Gödel, em um dos movimentos mais engenhosos
da história da matemática, converteu o Paradoxo do Mentiroso em uma fórmula
matemática. Ele provou que qualquer afirmação
requer um observador externo.
Nenhuma afirmação sozinha pode completamente provar
a si mesma como verdadeira.
O seu Teorema da Incompletude foi um golpe
devastador no “positivismo” da época. Gödel provou o seu teorema preto no
branco, e ninguém podia discutir com a sua lógica.
Ainda assim, alguns de seus amigos matemáticos
foram para o túmulo negando, acreditando que, de uma forma ou outra, Gödel
certamente estaria errado.
Ele não estava errado. Era mesmo verdade. Existem
mais coisas que são verdade do que você pode provar.
Uma “teoria de tudo” – seja na matemática, na
física ou na filosofia – nunca será encontrada. Porque é impossível.
OK, o que isso então realmente significa? Por que
isso é superimportante, e não apenas um factóide geek?
Isso é o que significa:
·
Fé e Razão não são inimigas. Na verdade, o exato oposto é
verdade! Uma é absolutamente necessária para que a outra exista. Todo o
raciocínio ao final leva de volta à fé em algo que você não pode provar.
·
Todos os sistemas fechados dependem de
algo fora do sistema.
·
Você pode sempre desenhar um círculo
maior, mas existirá sempre algo fora do círculo.
·
O raciocínio de um círculo maior para
um menor é “raciocínio dedutivo.”
Exemplo de um raciocínio dedutivo:
1. Todos os homens são mortais
2. Sócrates é um homem
3. Portanto, Sócrates é mortal
·
O raciocínio de um círculo menor para
um maior é “raciocínio indutivo.”
Exemplos de raciocínio indutivo:
1. Todos os homens que conheço são
mortais
2. Portanto, todos os homens são
mortais
1. Quando eu largo objetos, eles caem
2. Portanto, há uma lei da gravidade
que governa objetos de caem
Note que quando você se move do círculo menor para
o maior, você tem que fazer suposições que não pode provar 100%.
Por exemplo: você não pode PROVAR que a gravidade
sempre será consistente todas as vezes. Você só pode observar que ela é
consistentemente verdadeira toda vez. Você não pode provar que o Universo é
racional. Você só pode observar que fórmulas matemáticas como E = mc² parecem,
sim, descrever perfeitamente o que o Universo faz.
Praticamente todas as leis científicas estão
baseadas no raciocínio indutivo. Estas leis apóiam-se em uma afirmação de que o
Universo é lógico e baseado em leis fixas que podem ser descobertas.
Você não pode PROVAR isto. (Você não pode provar
que o Sol virá amanhã de manhã também.) Você literalmente tem que usar a fé. Na
verdade, a maioria das pessoas não sabem que além do círculo da ciência existe
um círculo da filosofia. A ciência está
baseada em suposições filosóficas que você não pode provar cientificamente.
Realmente, o método científico não pode provar, só pode inferir.
(A ciência originalmente surgiu da idéia de que
Deus fez um Universo ordenado que observa leis fixas e que podem ser
descobertas.)
Agora, por favor,
considere o que acontece quando desenhamos o maior círculo possível – ao redor
de todo o Universo. (Se existem múltiplos universos, nós estamos desenhando um círculo
ao redor deles todos também.):
·
Tem que existir algo fora desse
círculo. Algo que nós temos que assumir mas não podemos provar.
·
O Universo como nós conhecemos é finito – matéria finita, energia finita,
espaço finito e 13,7 bilhões de anos de idade.
·
O Universo é matemático. Qualquer sistema físico sujeito a
medição executa a aritmética. (Você não precisa conhecer matemática para fazer
uma adição – você pode usar um ábaco em vez disso e ele lhe dará a resposta
certa todas as vezes.)
·
O Universo (toda a matéria, energia, espaço
e tempo) não pode explicar a si mesmo.
·
O que quer que esteja fora do maior
círculo não tem limites.Por definição, não é possível desenhar um círculo ao redor dele.
·
Se desenharmos um círculo ao redor de toda a matéria, energia, espaço e
tempo e aplicar o teorema de Gödel, então saberemos que o que está fora desse
círculo não é matéria, não é energia, não é espaço e não é tempo. É imaterial.
·
O que quer que esteja fora do maior
círculo não é um sistema – i.e. não é um conjunto de partes. De outra forma poderíamos
desenhar um círculo ao redor delas. A coisa fora do maior círculo é indivisível.
·
O que quer que esteja fora do maior
círculo é uma causa não-causada, porque você sempre pode desenhar um círculo
ao redor de um efeito.
Nós podemos aplicar o
mesmo raciocínio indutivo à origem da informação:
·
Na história do Universo, nós também
podemos ver a introdução da informação, cerca de 3,5 bilhões de anos atrás. Ela veio
na forma do código genético, que é simbólico e imaterial.
·
A informação teve que vir de
fora, já que a informação não é conhecida por ser uma propriedade inerente da
matéria, energia, espaço ou tempo.
·
Todos os códigos cuja origem conhecemos
são projetados por seres conscientes.
·
Portanto, o que quer que esteja fora do
círculo maior é um ser consciente.
Em outras palavras, quando adicionamos a informação
à equação, concluímos que a coisa fora do maior
círculo não só é infinita e imaterial, como também é consciente.
Não é interessante como todas estas coisas soam
suspeitamente similar a como os teólogos têm descrito Deus por milhares de
anos?
Então é dificilmente surpreendente que entre 80 e
90% das pessoas do mundo acreditam em algum conceito de Deus. Sim, é intuitivo
para a maioria do pessoal. Mas o teorema de Gödel indica que é também
supremamente lógico. De fato, é a única posição que alguém
pode tomar e ainda assim permanecer nos domínios da razão e da lógica.
A pessoa que orgulhosamente proclama “Você é um
homem da fé, mas eu sou um homem da ciência” não entende as raízes da ciência e
a natureza do conhecimento!
Um aparte interessante…
Se você visitar o maior website ateu do
mundo, Infidels, na página inicial você encontrará a seguinte declaração:
“O Naturalismo é a
hipótese segundo a qual o mundo natural é um sistema fechado, o que significa
que nada que não seja parte do mundo natural o afeta.”
Se você conhece o teorema de Gödel, você sabe que
todos os sistemas lógicos devem contar com algo fora do sistema.
Então, de acordo com o Teorema da Incompletude de Gödel, o Infidels não pode estar correto. Se o Universo é lógico, ele tem uma causa
externa.
Assim, o ateísmo viola as
leis a razão e da lógica.
O Teorema da
Incompletude de Gödel prova definitivamente que a ciência não pode jamais
preencher suas próprias lacunas. Nós não temos escolha a não ser procurar fora da
ciência por respostas.
A Incompletude do
Universo não é a prova que Deus existe. Mas… É a prova de que, para se construir um
modelo racional e científico do Universo, a crença em Deus não é somente 100%
lógica… ela é também necessária.
Os cinco postulados de Euclides não podem ser
formalmente provados e Deus também não pode ser formalmente provado. Mas… assim
como você não pode construir um sistema coerente de geometria sem os cinco
postulados de Euclides, você também não pode construir uma descrição coerente
do Universo sem uma Primeira Causa e uma Fonte de ordem.
Assim, fé e ciência
não são inimigas, mas aliadas. Tem sido verdade por centenas de anos, mas em
1931 este jovem magricelo matemático austríaco chamado Kurt Gödel o provou.
Em nenhuma época na história da humanidade a fé em
Deus tem sido mais razoável, mais lógica ou mais amplamente apoiada pela
ciência e pela matemática.
________
Perry Marshall (traduzido para o português
por Mateus Scherer Cardoso)
Fonte: Cosmic Finger Prints.
________
“Sem matemática nós não podemos
penetrar profundamente na filosofia.
Sem filosofia nós não podemos penetrar
profundamente na matemática.
Sem ambas nós não podemos penetrar
profundamente em nada.”
Leibniz
“A matemática é a linguagem pela qual
Deus escreveu o Universo.”
Galileu
Pesquisado em: http://blogdo.yurivieira.com/2012/06/teorema-godel-fe-razao/ em 22/08/2014 as 16h00.
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